Disparidades da Covid-19

Tadeu Masano, professor do departamento de mercadologia da FGV-Eaesp (*)

Um dos epicentros da pandemia de Covid-19 no Brasil e no mundo, o município de São Paulo, que abriga 12 milhões de moradores, registra 8,1 mil óbitos pela doença distribuídos nos seus 96 distritos. Somados aos suspeitos (mais 5,5 mil), a cidade apresenta um indicador de 110 mortes para cada 100 mil pessoas. É um número elevado se comparado a Portugal, país com população parecida com a da capital paulista. Lá o registro é de 1,6 mil óbitos, ou seja, 12 por 100 mil (nove vezes menor).

Avaliando os dados gerais da capital, há pouca variação no indicador por 100 mil habitantes entre os distritos. Entretanto, vale ressaltar que alguns deles, como Sapopemba, Brasilândia e Grajaú, já estão com cerca de 300 óbitos cada um, superando municípios como Santo André, Jundiaí e Ribeirão Preto.

O indicador médio de mortes na cidade de São Paulo esconde disparidades abissais quando analisados os dados por faixa etária, renda e homens e mulheres. Chamam a atenção, por exemplo, as discrepâncias entre as idades, atingindo em proporções muito maiores os idosos. Enquanto na faixa mais jovem (até 29 anos) foram registradas 4 mortes por 100 mil, na dos maiores de 60 anos explodiu para 530 óbitos por 100 mil. Impressiona que nesta última faixa o indicador é 130 vezes que o da primeira.

Mesmo nas idades intermediárias, a variação é grande. Entre 40 e 49 anos, por exemplo, foram 46 óbitos por 100 mil. Mas é quase o triplo entre os de 50 a 59 anos.

Em porcentagem, de acordo com os últimos dados da prefeitura, os mais jovens representam apenas 1% do total de mortes na capital. Por outro lado, 89% dos óbitos foram registrados entre pessoas com 50 anos ou mais. E mesmo aí, os índices são muito diferentes: 14% de 50 a 59 anos; 22% de 60 a 69 anos; e 53% para os que têm 70 ou mais. A grande questão é que esse crescimento é inverso ao da distribuição da população —57% dos moradores do município têm menos de 39 anos.

Crédito: Frauke Riether por Pixabay 

Gênero – Outro ponto importante: a proporção de homens vítimas do novo coronavírus é muito maior do que entre as mulheres. O indicador médio na cidade (110 mortes por 100 mil) cai para 90 no feminino, mas sobe para 135 no masculino. Agora, pasmem, na faixa acima de 60 anos é mais de cinco vezes para o feminino (490) e mais de seis vezes no masculino (870).

Quando se analisa a renda dividida por cinco níveis (da mais alta até a mais baixa), na média os indicadores são semelhantes. Mas, ao avaliar também a faixa etária, as discrepâncias aparecem e ficam enormes nos extremos. Por exemplo, na camada superior de renda e faixa etária acima de 60 anos são 320 mortes por 100 mil, e na renda baixa é mais do que o dobro.

Em suma, a análise dos dados em São Paulo jamais pode ser feita pela média. Tanto que a relação de uma morte de jovem de até 29 anos com renda alta supera 300 óbitos no outro extremo, ou seja, pessoas com 60 anos ou mais de renda baixa.

A disponibilização de informações com qualidade e frequência permitiria o maior apoio da comunidade científica, o que possibilitaria colaborar no direcionamento de políticas de saúde pública. Não só em São Paulo, mas em outros cantos do Brasil, está comprovado que os idosos são a grande maioria das vítimas da Covid-19. Um dos exemplos para direcionamento de ações seria a aplicação de testes em massa nessa camada da população. Testar sem estratégia clara pode levar a desperdício de tempo e de dinheiro público e atrasar a retomada das atividades econômicas e dos empregos.

(*) Artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo em 11 de julho de 2020

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